Como ovelhas sem pastor - fariseus e escribas

No texto anterior, "Como ovelhas sem pastor", começamos a estudar a narrativa de Mateus 9:35 - 38:  

35 “E percorria Jesus todas as cidades e aldeias, ensinando nas sinagogas deles, e pregando o evangelho do reino, e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo.  36 E, vendo as multidões, teve grande compaixão delas, porque andavam cansadas e desgarradas, como ovelhas que não têm pastor.  37 Então, disse aos seus discípulos: A seara é realmente grande, mas poucos os ceifeiros.  38 Rogai, pois, ao Senhor da seara, que mande ceifeiros para a sua seara.”

Falamos de como Jesus olhava para as multidões com compaixão porque estavam como ovelhas sem pastor, e paramos para pensar de como a situação "ovelhas sem pastor" naquela situação era, não só, contraditória, mas como também é uma denúncia implícita à estrutura religiosa da época posto que o que mais havia em Israel no tempo de Jesus eram "pastores". o Senhor olhou para as multidões com compaixão, e os "pastores" como olhavam? A partir daí passamos a falar dos tipos de olhares dos "pastores" que havia no tempo de Jesus, a começar pelos saduceus. Neste vamos estudar um pouquinho a respeito do olhar escriba-farisaico sobre as multidões, ou seja, vejamos qual seu modelo "pastoral".

Os fariseus era um grupo religioso compostos por pessoas do povo. Fariseu significa "separado". Ou seja, os santos, o verdadeiro Israel, o verdadeiro povo de Deus. Homens extremamente devotados à Lei de Moisés. Estão profundamente associados aos escribas, que eram os "doutores da lei", os teólogos, responsáveis por interpretar e aplicar a lei á vida do povo. Tal é a ligação entre os fariseus e escribas que Mateus e Lucas geralmente usam a fórmula "escribas e fariseus" como um único grupo ao referirem-se os opositores de Jesus. este grupo se distinguia pela prática sistemática principalmente das orações, jejuns, esmolas, dízimo e ritos de purificação. Obviamente exerciam grande influência sobre o povo. Eram os responsáveis pela transmissão da tradição de Israel. Ensinavam nas sinagogas quem era o Deus de Israel. E, principalmente, ensinavam as minuciosidades da observância da Lei para se relacionar com Deus, para ser parte do povo de Deus. Tanto que, na concepção deles mesmos, somente eles, os fariseus, eram o "povo de Deus".

Sendo assim, como os fariseus olhavam para as multidões? Em suas próprias palavras: "Mas esta multidão, que não sabe a lei, é maldita!"

Primeiro: Viam as multidões como malditos, infiéis e pecadores, alienados do verdadeiro povo de Deus por sua própria infidelidade á Lei. Para os fariseus o problema das multidões é que elas não conhecem a Lei e não a praticam. Não obedecem à tradição de maneira aceitável. É necessário frisar que a tradição oral, a interpretação teológica dos fariseus tinha peso de Escritura. Logo, a tradição religiosa, a teologia dos escribas e fariseus era a voz de Deus para o povo.

Em última análise, o povo não é suficientemente religioso. Não conhece bem a teologia da tradição judaica, não se aplica às doutrinas da religião sua religião. São uns malditos, pois sem isso, jamais serão povo de Deus. Enquanto não se enquadrarem em seus esquemas e seus sistemas religioso, as multidões são malditas. Quem, em sã consciência consegue dormir com um barulho desse? Duas alternativas possíveis: 1. Ou as multidões se submetem ao peso da religião e suas exigências ou, 2. Aceitam o fato de que são malditas e que estão condenadas. (os mais sinceros ficam com a segunda opção)

É impressionante como as estruturas permanecem as mesmas. Satanás é pragmático. Se está dando certo, porque mudar?!

Pense em qualquer sistema religioso da terra, qualquer um, o princípio é o mesmo. Seus líderes, "pastores", ocupar-se-ão sempre em "catequizar" as multidões de acordo com sua teologia, sua doutrina. Caso contrário as multidões são carimbadas com o selo "maldito", "pecador", "desviado" (esse último é para quem até tentou, mas não conseguiu).

Segundo: "os escribas e fariseus" viam as multidões como fonte de poder e prestígio pelo simples fato de que quanto mais malditas fossem as multidões, mais "santos" eles seriam, mais poder e prestígio teriam. Daí a religião deles ser altamente excludente.

Sob o paradigma do olhar pastoral escriba-farisaico, relacionar-se com Deus é relacionar-se com as doutrinas e a teologia da religião. Para tanto será necessário que aquele que quer se relacionar com Deus passe por "classes" de iniciação, e que conheça as construções e tradições teológicas básicas da sua religião.

Certamente esse não foi o olhar de Jesus. Jesus ensinou o tempo todo como se relacionar com Deus, e a todo momento dizia: "foi lhes ensinado assim... eu porém vos digo", ou "veja com eles fazem, assim não será entre vós...". De modo que Jesus não transmitiu nenhum sistema religioso aos seus discípulos. Ensinou-lhes a ser gente como Deus fez para ser. ensinou-lhes como se relacionar com o Pai e com o próximo.

imagine a cena: Jesus de baixo do manto umas folhas contendo lições, entrega para os discípulos, um a um. E diz: "vamos começar nosso estudo sobre o Reino", ao que Pedro o interpela abruptamente e diz: "eu é que vou ler o número 1...". Tomé desabafa: "duvido que o Senhor consiga terminar o estudo antes do jogo". Ao terminar o estudo, Jesus pede para recolher as folhas, percebe que só retornaram onze. Mas, Jesus, conhecendo o coração dos discípulos sabia que Judas estava guardando os estudos para futuramente lançar um livro com o título: "o discipulado de Jesus."

Em Jesus, que é o pastor dos "malditos".
Timóteo


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